A Marcha dos Pingüins ou Rebeldes do SBT
Danilo e Tatiana
Nas últimas três semanas, um milhão de estudantes secundaristas chilenos foram às ruas para protestar contra a situação do ensino público em seu país. Os protestos começaram no dia 19 de maio, quando os estudantes do Instituto Nacional, um dos colégios mais tradicionais do Chile, e decidiram parar as aulas. Cerca de 650 colégios serviam de acampamento e local de protesto para os estudantes, que, satisfeitos com as conquistas do movimento, voltaram às aulas ontem.
Para organizar o maior protesto estudantil do país desde os tempos da ditadura militar, eles contaram com a ajuda de uma ferramenta fundamental: a internet.
Os blogs, fotologs, videoblogs e programas de mensagens permitiram a rápida coordenação entre os colégios de todo o país, garantiram o sucesso das manifestações e a repercussão do movimento por todo o mundo. O principal alvo do protesto foi a Lei Orgânica Constitucional de Educação [Loce], promulgada ainda no governo do ditador Augusto Pinochet [1973-1990], e também luta pelo passe livre nos transportes públicos e isenção de taxas para inscrição no vestibular.
PASSE LIVRE – O estopim para as manifestações foi a digitalização do transporte público [como aconteceu aqui com o Salvador Card]. Os estudantes ficaram apreensivos com uma possível mudança no número de viagens do passe estudantil e com o aumento da taxa de inscrição do vestibular, anunciada em abril. Mas a mudança no governo federal – Bachelet assumiu em 11 de março – também impulsionou os protestos.
"Tudo começou porque os estudantes resolveram lutar pelo passe livre nos ônibus. As escolas foram tomadas e as ruas ficaram cheias de cartazes. Houve até confronto entre estudantes com os carabineiros [policiais] no centro da cidade. Mas a maioria da população está apoiando os estudantes", conta o desenhista baiano Rodrigo Pereira, 24, que estava em Santiago, capital do Chile, no momento dos protestos.
LOCE – A lei Orgânica Constitucional de Educação, que foi aprovada no último ano do regime do ditador Augusto Pinochet, municipalizou o ensino e permitiu que cada colégio escolhesse seu currículo – o que torna o ensino desigual, dizem os estudantes. Para se ter uma idéia, o custo mensal de um estudante chileno varia entre US$160 e US$ 800, a depender da escola.
A LOCE também tornou possível colégios subsidiados, em que os estudantes pagam pequenas mensalidades e o governo envia o restante dos recursos. Mas eles dizem que não há controle sobre o uso do dinheiro repassado e reclamam da queda na qualidade do ensino e da infra-estrutura das escolas.
Durante a sua campanha à presidência, Bachelet prometeu que faria uma ampla reforma no sistema de educação e agora ela é cobrada por dar respostas pouco satisfatórias ao tema. "Nós devemos aproveitar a situação para restituir a prioridade à educação e aprofundar a reforma educacional com os objetivos de equidade e melhor gestão", explica Gregory Elacqua, professor da universidade chilena Adolfo Ibañez e consultor internacional de políticas educacionais na América Latina. "Os princípios da reforma educacional são basicamente dois: diminuir a enorme desigualdade e melhorar a qualidade do ensino", completa.
PROTAGONISTAS – Os estudantes se dividem entre grupos moderados, mais propensos a aceitar as propostas do governo, e radicais, que lutam para que as coisas sejam feitas à sua maneira. À frente da ala radical estava uma moça de 16 anos: María Jesús Sanhueza. María se declara comunista e é polêmica [o que vem primeiro?].
De acordo com jornais chilenos, alguns acham que ela estava politizando o movimento [qualquer semelhança com o que acontece por aqui não é mera coincidência].
Outro representante dos estudantes [lá chamados de voceros, porta-voz] que se tornou célebre nas manifestações foi Cesar Valenzuela, 17, socialista e espécie de sex symbol do movimento. Em 6 de junho resolveu deixar o cargo para cuidar da mãe doente [o que deve ter servido para deixar as “chicas” ainda mais apaixonadas].
VITÓRIAS – A pressão dos estudantes secundaristas deu certo e eles conseguiram quase tudo que reivindicavam. Bachelet ampliou o passe escolar, com subsídio para os 40% mais pobres, e tornou gratuito o PSU [prova de seleção universitária, cuja inscrição custa US$ 40] para 80% estudantes secundaristas. A presidente já prometeu reformas na estrutura das escolas e ampliou o direito de almoço gratuito para 770 mil alunos.
Eles também ganharam seis vagas no Conselho Assessor que irá discutir mudanças na Loce [outras seis das 76 vagas são para estudantes universitários]. Eles queriam 51% dos assentos no Conselho, que também conta com a participação de padres, professores e políticos, mas não conseguiram. O passe livre no transporte público também permanece no campo dos sonhos. Bachelet disse que não teria como arcar com os custos de 166 milhões de pesos por ano [US$ 300 milhões].
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