Mais ocidental que o ocidente
Mais de um século depois do auge do imperialismo inglês estréia em Salvador Old Boy, do diretor coreano Park Chanwook. O filme apresenta um bêbado gordo e feio chamado Oh Dae-Su (Choi Min-Sik); um sujeito que, depois de um pequeno problema com a polícia, acorda preso em um quarto de hotel barato. Sem fazer a menor idéia do motivo pelo qual está preso ali, Dae-Su passa seus dias assistindo à programação da TV e comendo rolinhos fritos. Os anos passam até que 15 anos depois ele é libertado, porém sem receber qualquer explicação. Ganha novas roupas, dinheiro e um telefone celular, que não tarda a tocar tranzendo o seguinte desafio: Dae-Su tem cinco dias para descobir o motivo de sua captura e a identidade de seu captor.
Além do título, Old Boy não tem quase nada de inglês. Porém, ao assisti-lo, o espectador ocidental de cinema encontra uma estranha sensação de familiaridade: tudo o que se passa na tela parace muito próximo de nós, de tão ocidental. Ao mesmo tempo, de tão ocidental, tudo parece muito estranho. Ao assistir aos últimos lançamentos do cinema oriental encontramos uma sensação parecido, de hiper-ocidentalidade. Depois de anos e mais anos absorvendo, meditando e processando a cultura ocidental, esses povos, mesmo com seus olhinhos bem puxados, parecem ter encontrado algum sentido escondido nela. Agora eles a cospem de volta, nos mangás, nos animes, nos videogames e, como não poderia deixar de ser, no cinema. Porém a cospem modificada, potencializada.
Talvez por sua vasta tradição gráfica, que se mostra desde seus alfabetos, os orientais parecem manejar o material gráfico com uma desenvoltura invejável, mesclando a linguagem dos quadrinhos, videogame e romances de artes marciais em uma estilo que faria inveja a qualquer diretor do cinema de ação hollywoodiano. Aí está a maior qualidade de Old Boy: é um filme, antes de tudo, urbano – com todas as implicações que este termo pode oferecer. O cenário é uma metrópole, movimentada, suja e barulhenta. Porém, o maior atrativo do filme está no modo como ele trata os clichês dos principais gêneros do cinema americano: do cinema de tarantino aos suspenses de Hitchcock. As cenas de luta pouco lembram os antigos filmes de kung-fu chineses, estão mais para videogame. A melhor delas evoca os jogos "side scroll" dos antigos videogames de 8 e 16 bits, no estilo de Street Fighter. Nela, Dae Su esmurra vinte capangas com um martelo em um plano-seqüência lateral. A sequência é bem-humorada, tosca, mas é uma das melhores cenas de luta já realizadas.
Por fim, temos o final. Admito não gostar de filmes com reviravoltas em seus minutos finais, mas o desfecho de Old Boy merece ser comentado. Ele e tão surpreendente, perturbador que sozinho já valeria o ingresso do cinema. É isso. Old Boy é um ótimo argumento para aqueles que insistem em criticar a globalização. Enquanto Tarantino, entre outros, voltam os olhos para o oriente em seus últimos trabalhos, filmes como Old Boy nos fazem crer o quanto ainda temos o que aprender com nós mesmos.