Matilha
Durval Weyll*
Então Lígia dirige eufórica, repleta de problemas que serão aliviados com um baseado e bom sexo antes de dormir. A demissão de parte do quadro de funcionários na empresa a deixa preocupada, mas seu namorado, Carlos, pode fazer a situação parecer menos deprimente. Ela tenta pensar em carícias sem pressa, beijos fogosos e mãos perdidas sobre o corpo enquanto avança mais um sinal vermelho, temerosa pelo horário nas vias ilheenses. Ao sair do Polo Industrial, imagina o Alto do Amparo para comprar as cinqüenta gramas de maconha a fim de durar a semana, pois na Conquista e na Santa Clara as bocas passaram a vender um material prensado com amônia que irrita a sua garganta e a deixa com uma dor de cabeça aguda.
Lígia tenta sentir algo pelas menores na beira da pista, com trapos tão minúsculos que chegam a ser ridículos, mas não consegue; tudo parece pior -mais gélido- a cada dia. Garotas de treze a dezessete anos se prostituem por cinco reais ou uma pedra de crack, fato já comum e inabalável às pessoas da sociedade. As meninas se prostram faceiras, em mãos erguidas, esperando por um porco que alivie a dor de seu vício.
Após contornar o Parque Infantil e seguir à esquerda no semáforo para a Avenida Oceânica, Lígia está na decadente zona boêmia da cidade. Antigamente havia um fluxo imenso de caminhoneiros que -com o seu apetite sexual- traziam doenças venéreas de todo o Brasil para a localidade. O relógio marca onze horas e Lígia se apressa, antes que Carlos durma.
Ao subir a ladeira para o Alto do Amparo Lígia percebe algo fora do habitual, que seria três ou quatro boqueiros andando pela rua; tudo está tão calmo que o barulho do motor chega a ser uma agressão. Dirige-se ao final da rua escura em frente à igreja evangélica para encontrar alguém e nada vê, portanto, resolve sair do carro e buscar por um caboclo que dispense a erva.
Lígia caminha pelo escuro e vê um rapaz atordoado que, após a perceber, caminha ao seu encontro. Em pânico parecido -ou de fato- com o efeito do crack, ele pergunta:
-E aí, qual vai ser?
-Quero cinqüentinha da massa.- responde a moça.
-Nós tem pedra também, é o pânico!
-Não, só a massa mesmo.
-Se ligue, cliente, cinqüenta tá russo! Só tem bala de cinco.
-Aí você me quebra, mo fio!
-Nós tudo já é quebrado mesmo!- sorri o rapaz.
-Então faz o seguinte, me passa quatro balas.
-Tem como me arrumar dois real pra fazer intera numa bicha?
-Tem não.
-Porra, madame, tu chegou pra comprar cinqüenta e não quer me considerar dois real?
-É, né? Depois fico sem grana pra comprar as tais cinqüenta.- Lígia expressa certo desprezo.
-Qual é a sua, vadia, tá fazendo marra, é?- o rapaz faz uma careta inteligível.
Lígia se preocupa e diz:
-Olha, deixa quieto. Eu vou indo.- caminhando para o carro.
O rapaz a segura pelo braço e esbraveja:
-Qual é, vadia, tá pensando que eu sou viado, é?
-Moço, me larga agora!- assustada, mas com um olhar decidido.
-Ih, olha só a vadia: sobe no morro cheia de regra e acha que pode mais que o outros!- assustando Lígia.
-Moleque, me larga.
-Cadê o real?- passa a mão esquerda nos bolsos da moça.
-Ei, quem você pensa que é, caralho?- tenta chutá-lo sem sucesso.
O rapaz a empurra contra a parte de fora da porta do carro e a estapeia na nuca com o dorso da mão, dizendo:
-Sua fela da puta, aqui não tem ninguém pra me mandar parar.
Lígia cai no chão e muda o discurso:
-Moço, façamos o seguinte, eu te dou a grana e você me deixa ir.
-Passa esse caralho, vadia.
Lígia tira os trinta e cinco reais do bolso e estende a mão:
-Toma, fica com ele.
-Eu tô desconfiando que tu tem mais do que isso, vadia. É só olhar pra essa barca que te trouxe pra me deixar empolgado.
-Não tenho nada mais.- realmente não tem, além de documentos da empresa e alguns cartões de crédito em sua bolsa.
-Fala sério, sua vagabunda, eu vou entrar contigo nessa porra e procurar. Se eu não achar grana vou ter que te meter a pica.
-Moço, não precisamos resolver as coisas assim.
-Então me passa o real.- Lígia, no chão, está entre as pernas do rapaz.
-Mas eu não tenho.- Lígia chora.
O rapaz, ao vê-la chorar, não se abate e comenta:
-Vai chorar? Assim que é bom.- empurra-a para o banco do fundo do carro, entra logo em seguida e fecha a porta. -Vou esperar a madame tomar uma atitude pra eu fazer uma festa hoje.
-Moço, já te disse que não tenho nada.
-Não quero nem saber.- dá um soco na face de Lígia e desabotoa as calças. -Quer fazer marra?
-Moço, não faz isso, pelo amor de Deus!
O rapaz esbofeteia a cara de Lígia algumas vezes e arranca a sua blusa:
-Belas tetas, vadia. Sabe que nunca comi uma branquela tão gostosa? Tira a saia pra evitar trabalho!
-Não vou tirar. Você não vê que se compromete fazendo isso?
-Como? Tá noiada, desgraçada?- arrancando a saia e a calcinha de Lígia com raiva.
Lígia grita desesperadamente enquanto o rapaz a esmurra sem piedade, até a calar. Com o rosto desfigurado, cheio de hematomas, a moça se entrega para que tudo termine o mais rápido possível.
*Durval é estudante de Admnistração e leitor do Dez!. Mande seu texto para cá.