História em quadrinhos
Danilo Fraga
Em 20 de março de 2003, os exércitos americano e inglês iniciaram uma ofensiva terrestre contra o Iraque. O ataque fazia parte da “guerra contra o terror“, iniciada após os ataques de 11 de setembro. Em 1º de maio do mesmo ano, o presidente americano George W. Bush declarou o fim da guerra e a dissolução do governo de Saddam Hussein.
Nesta mesma época, o jornalista Anthony Lappé estava no Iraque. Ele escrevia sobre a guerra para seu blog [anthony.gnn.tv], enquanto filmava o documentário “Battleround: 21 Days on the Empire’s Edge”. A partir de sua experiência no fronte, Lappé criou os quadrinhos “Shooting War“ – publicados toda semana no site da Smith [smithmag.us/shootingwar], uma revista online.
“Os quadrinhos foram inspirados no meu trabalho como reportagem na guerra do Iraque. Não é exatamente sobre o que eu vi e o que eu fiz lá, mas sobre o que eu pensei e sonhei também”, explica Lappé em entrevista a A TARDE.
Além das ilustrações de Dan Goldman, a série conta com a trilha sonora de DJ Spooky, feita a partir sons reais, gravados por Lappé no Iraque. O décimo episódio da série entra no ar amanhã.
GUERRA SEM FIM Segundo Bush, a guerra do Iraque acabou em maio de 2003. Mas um dossiê apresentado pela Missão de Assistência da ONU no Iraque [Unami] mostra que, depois do “fim“ do conflito armado, houve mais mortes que na própria guerra. Desde o cessar-fogo proclamado por Bush, pelo menos 50 mil pessoas já morreram – das quais, 18.933 em ataques militares e terroristas, entre 5 de abril de 2004 e 1º de junho de 2006. É disto que trata “Shooting War”.
“Quando se fala de histórias em quadrinhos, a maioria das pessoas pensa em heróis com fantasias. Mas, nos últimos anos, tornaram-se freqüentes HQs não-ficcionais, de diversos gêneros e estilos”, explica Aristides Dutra, mestre em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro [UFRJ] e pesquisador de quadrinhos.
Além da série “Shooting War“, que mistura realidade e ficção, as histórias em quadrinhos usam vários caminhos para se relacionar com a História e com o jornalismo. Desde biografias, como a série “Maus“ de Art Spiegelman, que conta a história de Vladek e Anja [pais de Art] nos campos de concentração na Segunda Guerra, até os livros-reportagens de Joe Sacco, que mostram a realidade pós-guerra na Palestina e Sarajevo.
“Uma reportagem pode ser riquíssima em detalhes, mas uma boa charge é muito mais eficiente para transmitir uma opinião. Funciona do mesmo modo nos quadrinhos jornalísticos“, explica Aristides.
FICÇÃO REAL – Em “Shooting War” o enredo se passa em 2011. Neste futuro, a guerra do Iraque nunca acabou de verdade e o terrorismo tampouco. ”Os americanos tiveram a oportunidade de fazer a invasão ao Iraque funcionar, mas eles erraram em tudo. Nós esperávamos a volta da ordem e da justiça no país, mas o que aconteceu foi caos e violência.
Os iraquianos tiveram seu 11 de setembro e, por isso, acho que essa situação desastrosa ainda vai durar por anos”, explica Lappé.
O personagem principal é Jimmy Burns, alter ego de Lappé. Ele é um jornalista militante que presencia um ataque terrorista enquanto fazia uma reportagem para seu blog.
Depois de conseguir as imagens em primeira mão, torna-se uma lenda no meio jornalístico e é mandado para o Iraque por uma grande rede de televisão. Ele deveria apenas cobrir a guerra, mas acaba preso por um grupo de terroristas.
“No futuro em que minha história é contada, o mundo vive uma crise global de petróleo, os EUA estão em recessão e a guerra civil no Iraque ainda dura. O cenário pode até ser pessimista, mas é só olhar para os jornais de hoje para ver que ele não é nada impossível“, explica Lappé.