Leia na minha camisa
Pedro Fernandes
pfernandes@grupoatarde.com.br
Não se iluda, você também é o que você veste. Aquelas camisetas de bandas de rock, ícones pop, signos retrô ou com frases irônicas que no armário se não dizem quem você é, certamente denunciam quem você quer ser. “A camiseta, mais do que qualquer outra peça do vestuário, pode ser apontada como forma de expressão, individual ou coletiva. Uma das peças do vestuário mais democrática, ela veste jovens, crianças e idosos, homens e mulheres, ricos e pobres“, diz Maria Eduarda Guimarães, doutora em ciências sociais e professora do mestrado em Moda das Faculdades Senac [São Paulo].É só dar um passeio pela internet, por fotologs ou lojinhas disfarçadas de banca de revistas. Estão todos querendo vender e vestir camisetas diferentes para pertencer a algum lugar onde todos querem ser iguais. Segundo a cientista social, "a construção das identidades é um sistema dinâmico no qual o indivíduo pode intervir sobre si e se reestruturar a partir da criação de múltiplos papéis sociais. As escolhas na forma de vestir estão relacionadas com essa construção de identidades e por isso, além de expressarem uma individualidade, estão relacionadas ao pertencimento a um ou mais grupos de identificação".Punks, rappers, darks, rockers e patricinhas criam seus próprios estilos para reafirmar suas identidades dentro dos seus grupos. É por isso que a indústria da moda tem como principal alvo a juventude.
Faça você mesmo - Mas há quem não espere pela indústria e pelas vitrines. Por isso a estudante de biologia Marcela Oliveira, 18, criou uma marca de camisetas, a Miss Rock, que vende num fotolog para pessoas que querem um visual ”alternativo”, como ela mesma. ”Meu público é bem variado. Vai de crianças a senhoras de 50 anos. Todos querem parecer jovens e estar diferentes”. Para vender essa imagem de juventude ela aposta em estampas de ícones pop como Marilyn Monroe, Betty Page ou singelas fadinhas. ”Procurava coisas diferentes nas lojas de Salvador e nunca achava ou eram muito caras“. A marca existe desde mai.Da mesma maneira, em 2004, o designer Adriano Tosta, 27, colocou no ar o site da sua marca de camisetas, a Seeds ,para vender as peças que ele mesmo produz. "A idéia nasceu como nascem todas as idéias: da falta de dinheiro", brinca. A produção não é em larga escala, o que leva gente que procura exclusividade a comprar seus modelos."Meu público é formado por pessoas jovens, que não têm preconceito com nenhum tipo de idéia e com espírito vanguardista". Como na coleção de Marcela, os ícones pop como Elvis Presley, Charles Chaplin ou bonequinhas Pucca são o carro-chefe. De acordo Maria Eduarda o vestuário sempre teve uma função de comunicação, pois estabelecia a relação de cada indivíduo com a comunidade. “O traje revelava a vinculação a uma determinada classe social, gênero, idade, profissão“.Hoje essa rigidez já não existe mais. A partir do crescimento das cidades entre os séculos 16 e 19 e da consequente maior circulação de pessoas, as diversas identidades urbanas passaram a ser construídas independentemente da classe social. ”Não existem mais referências reais sobre quem são essas pessoas e a forma como elas escolhem o seu vestuário pode ser considerada como o primeiro sinal de identificação“.É aí que a camiseta entra. O fato de ser de fácil acesso a todas as pessoas faz dela o suporte ideal para estampar todo tipo de idéia. De campanhas beneficentes ou políticas à frases bem humoradas. "Verdadeiro papel em branco, a camiseta deixou de ser apenas um produto da indústria da moda para se transformar em forma de comunicação e expressão das identidades".
[coordenada]Grandes negóciosEsse apelo que a camiseta tem fez o carioca Fábio Seixas, 31, mais dois sócios importarem no fim de 2004 uma idéia americana de um site que vende camisetas feitas pelos próprios usuários. A Camiseteria [www.camiseteria.com] já tem dez meses no ar e uma média de 10 mil visitas por dia, 500 camisetas vendidas por mês, numa média de produção de três estampas mensais. Funciona assim: qualquer pessoas pode enviar estampas para serem escolhidas por votação dos usuários. Ao fim de dez dias a estampa vencedora sai da web e vira camiseta. O designer responsável ganha R$ 200 em dinheiro mais R$ 300 em produtos do site. ”Nosso modelo de negócio funciona porque é baseado no relacionamento dos usuários do site e na relação que é construída com o produto que ele ajudou a criar. Ele faz parte do produto“, explica Fábio. ”As pessoas querem fugir do óbvio e ter roupas exclusivas, de vanguarda“.O perfil de quem compra na Camiseteria é de pessoas na faixa de 25 anos, urbano [65% dos clientes está no eixo Rio-São Paulo], com acesso a internet e grana suficiente para pagar R$ 50 por camisa.